Esquema conhecido como “Cai-Cai” atrai muitas pessoas que arriscam a vida no deserto
Já ouviu falar no “Cai-Cai”? Trata-se de uma tática cada vez mais utilizada por estrangeiros que desejam entrar de forma ilegal nos Estados Unidos. A estratégia é simples, mas extremamente arriscada: cruzar o deserto mexicano em direção a fronteira e, uma vez em território americano, caso sobreviva a todos os desafios e perigos do deserto, se entregar às autoridades de fronteira (CBP) do país e solicitar asilo.
“As leis permitem que um imigrante que se entregue voluntariamente ao cruzar a fronteira possa responder a um processo de asilo nos EUA em liberdade condicional ou, em uma segunda hipótese, ficar detido no país à espera de um processo de deportação. Em ambos os casos, existe a possibilidade de apelar para um juiz federal, alegando os motivos pelo qual a pessoa considera que merece o direito a permanecer nos Estados Unidos, mesmo tendo entrado de forma irregular” – explicou Marcelo Gondim, advogado de imigração em Los Angeles, Califórnia.
Em geral, os motivos alegados são de ordem humanitária, já que muitos dos que se utilizam do Cai-Cai estão vindo de zonas de guerra ou de países que passam por extrema pobreza, além de casos em que o imigrante alega ser vítima de perseguição política, racial, sexual ou religiosa em seu país de origem.
Segundo o Instituto Migration Policy em estudo publicado em maio de 2023, durante muitos anos, a tática do “Cai-Cai” foi utilizada majoritariamente por imigrantes vindos do México ou da América Central, em especial El Salvador, Honduras e Guatemala. Entretanto, cada vez mais pessoas de outras nacionalidades vêm aderindo a esta estratégia. Entre elas, milhares de brasileiros.
“Existem muitos grupos no WhatsApp e nas redes sociais que espalham fake news e incentivam a prática do Cai-Cai para brasileiros que sonham em morar nos Estados Unidos. Infelizmente, muita gente tem embarcado neste conto-de-fadas e arriscado a vida atravessando o deserto, quase sempre sendo guiados e enganados por atravessadores (coiotes) que chegam a cobrar mais de 30 mil dólares por este “serviço” – observou Gondim.
De acordo com a Polícia Federal, 2022 foi o ano com o maior número de brasileiros que tentaram cruzar a fronteira, e posteriormente foram deportados dos Estados Unidos, com 4.516 pessoas trazidas de volta ao Brasil em 42 voos. No total, desde 2019, mais de 9 mil brasileiros já foram deportados.
Um dos casos de “Cai-Cai” envolvendo brasileiros ganhou destaque na mídia em 2022: a história da técnica de enfermagem Lenilda Oliveira dos Santos, que faleceu por desidratação tentando cruzar a fronteira do Novo México para chegar aos EUA.
Sem dúvida, não há fronteira terrestre mais perigosa do que a dos Estados Unidos com o México. Segundo dados divulgados em setembro de 2023, pela OIM (Organização Internacional para as Imigrações), 686 pessoas morreram ou desapareceram na fronteira nos últimos 12 meses. Entre as principais causas de mortes estão: afogamento, acidentes com veículos ou por insolação ou frio extremo.
“O Cai-Cai é uma prática muito arriscada, seja pelas dificuldades do deserto, possibilidade de ser enganado por um coiote ou pelas punições que o imigrante pode sofrer, como prisão e deportação, e que certamente não vale a pena. Até porque existem diversas vias legais imigratórias para quem deseja entrar pela porta da frente dos Estados Unidos” – decretou Gondim, que há mais de 20 anos trabalha com Imigração nos EUA, e já defendeu centenas de brasileiros em processos contra deportação do país.
Desde o início do governo Biden, em 2021, todos os meses cerca de 200 mil estrangeiros tentam entrar ilegalmente pela fronteira americana, o que já totalizou quase 4 milhões de detenções, com mais de 300 mil pessoas deportadas para seus países de origem ou removidas para o México, naquela que é considerada a maior crise humanitária da história dos EUA.
Sobre o especialista: Marcelo Gondim
Marcelo Gondim é advogado especializado em imigração para os EUA, com mais de 20 anos de experiência em processos de green card e vistos americanos. Ele é licenciado pelo Estado da Califórnia. Marcelo nasceu no Brasil e também possui cidadania americana. Ele é o fundador e principal advogado da Gondim Law Corp, escritório de advocacia imigratória situado em Los Angeles, Califórnia.